Blogue essencialmente de poesia, alguma prosa e outras informações de carácter geral sobre o Alentejo e seus artistas
quinta-feira, 31 de agosto de 2017
CAIU A NOITE
Caiu a noite, aos poucos, na cidade grande.
Acendem-se as luzes que lhe trazem mais brilho,
maior beleza aos olhos que a contemplam.
Há lugares que parece transformarem-se
comparativamente ao seu aspeto durante o dia!
Começa uma outra vida,
bem diferente da que preencheu
(por uma necessidade real de sobrevivência)
as nossas vidas até há pouco,
sob a luz do astro-rei.
É agora outra a azáfama
dos que a vivem ou têm que a viver
por dever de ofício!
A cidade não pára,
embora em moldes diferentes.
Uns, a escolhem para seu prazer e, outros,
a têm para seu sustento,
mercê de actividades que desenvolvem
nos lugares procurados por aqueles
que a vêm desfrutar.
Há um ambiente mais propício
ao convívio entre uns e outros,
uma maior aproximação que cativa
e faz criar laços de amizade.
É um forte motivo de atração,
depois de um dia de trabalho,
em que as pessoas se preocuparam,
acima de tudo,
com os seus deveres de caráter profissional.
Cada um à sua maneira,
procura, agora, os lugares
onde se sente mais confortável,
onde também já tem os seus amigos
de diversão noturna, tudo girando,
afinal, à volta do seu bem-estar,
esquecendo ou procurando esquecer,
os problemas do dia a dia.
A vida à noite tem atrativos,
que sendo (idealmente) bem aproveitados,
contribuem para um maior
equilíbrio das nossas vidas.
Todos sabemos, ainda assim,
que se correm muitos perigos
na noite da grande cidade
e é preciso que todos, também ,
não percam a compostura
e a saibam viver de acordo
com as boas normas que devem,
que têm que presidir, num ambiente,
que é, essencialmente, de diversão,
onde um copo a mais pode estragar tudo.
É isso que se não deseja!
Por isso, atenção, amigos da noite...
Pessoalmente,
incluo-me no grupo
dos que gostam da noite,
embora cada vez a desfrute menos,
mercê da idade.
Noutros tempos, sim,
adorava a chegada da noite
(que me dava uma outra perspetiva da vida)
e hoje sinto saudades,
que suavizo com uma ida ao cinema,
a um jantar familiar ou de amigos,
assim como a um bom jogo de futebol.
Que cada um faça a sua escolha!
Se for a da noite, então...
que se divirta com os amigos
e nela possa encontrar o bem-estar
que complete a sua vida
nesta sua passagem pela Terra.
O meu abraço.
JGRBranquinho - "Zé do Monte"
NOTA:_ A concluir.
terça-feira, 29 de agosto de 2017
DO NOSSO ADEUS
DO NOSSO ADEUS
Do nosso adeus,
o que restou, meu Amor?
Olhámo-nos em silêncio,
não chorámos!...
Apertámos nossas mãos,
abraçámo-nos fortemente,
beijámo-nos repetidamente,
sentidamente!
Num gesto sem mais palavras,
desci a rua, parei diversas vezes,
olhei para trás, e lá estavas junto à porta,
seguindo os meus passos trémulos
muito por razão das minhas emoções,
fruto natural do que me ia na alma!
Dobrei a esquina da calçada,
com a tua ímagem já tão saudosa, quanto viva!
Encaminhei-me para o carro e...então... chorei de raiva!
Por que tinha que ser assim?!
Eu não poderia continuar ali
e tu não poderias, ainda, acompanhar-me.
Deixar-te ali tão longe, foi doloroso!
Acredito que também para ti.
Difícil de aceitar, sim.
Até quando terá que ser assim?
O tempo caminha muito devagar
para quem tanto se quer!
O nosso ansiado futuro
há de ser o que Deus quiser.
Confiemos, meu Amor!
Só nos resta saber esperar.
JGRBranquinho- Little White"
NOTA:- Poema sem data
segunda-feira, 28 de agosto de 2017
SONETO CAMONIANO:- " SETE ANOS DE PASTOR SERVIA"
.
O soneto Sete anos de pastor Jacob servia aparece na edição da poesia lírica camoniana levada a efeito por Azevedo Filho com o seguinte texto, fixado a partir da tradição manuscrita em confronto com a tradição impressa (Camões, 1989: 887
O soneto Sete anos de pastor Jacob servia aparece na edição da poesia lírica camoniana levada a efeito por Azevedo Filho com o seguinte texto, fixado a partir da tradição manuscrita em confronto com a tradição impressa (Camões, 1989: 887
Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por soldada pretendia.
Os dias na esperança de um só dia
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel, lhe dava Lia.
Vendo o triste pastor que por enganos
lhe fora assi negada sua pastora,
como se a não tivera merecida,
tornando já a servir outros sete anos,
dezia: –Mais servir(i)a, se não fora
p[e]ra tão longo(s) a[m]o[r] tão curta vida.
Trata-se de um soneto em que o assunto fulcral é a pertinácia no amor, aqui simbolizada pela narração sucinta da história bíblica de Jacob. Através de um processo singular de adaptação poética em face da fonte de inspiração, onde os elementos menos comovedores, com grande sensibilidade, desaparecem, Jacob representa uma personagem que ultrapassa todas as barreiras a fim de merecer a pessoa que ama.
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por soldada pretendia.
Os dias na esperança de um só dia
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel, lhe dava Lia.
Vendo o triste pastor que por enganos
lhe fora assi negada sua pastora,
como se a não tivera merecida,
tornando já a servir outros sete anos,
dezia: –Mais servir(i)a, se não fora
p[e]ra tão longo(s) a[m]o[r] tão curta vida.
Trata-se de um soneto em que o assunto fulcral é a pertinácia no amor, aqui simbolizada pela narração sucinta da história bíblica de Jacob. Através de um processo singular de adaptação poética em face da fonte de inspiração, onde os elementos menos comovedores, com grande sensibilidade, desaparecem, Jacob representa uma personagem que ultrapassa todas as barreiras a fim de merecer a pessoa que ama.
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Jacob serviu Labão durante sete anos para obter Raquel, que amava, como prémio desse trabalho. Enquanto os dias passavam vagarosamente, o sofrido pastor tinha só o sustento da visão da amada, com a esperança de a alcançar no futuro. Contudo, quando acabou esse longo período, Labão decidiu que Jacob recebesse Lia, outra filha, e não Raquel, tal como era o seu desejo.
Jacob não ficou desiludido e começou a servir Labão durante mais sete anos. As palavras finais do soneto, pronunciadas pela própria personagem emotivamente em estilo directo, manifestam o ânimo firme de Jacob, que exprime que estaria disposto a servir Labão ainda mais tempo para conseguir Raquel.
Sete anos de pastor Jacob servia apresenta, embora só em aparência, um estilo primacialmente descomplicado, sendo esta se calhar uma das causas principais da sua dilatada fama. É evidente que na configuração verbal do texto predomina, pelo menos no plano mais superficial, uma certa tendência à nudez retórica (Dasilva, 2001: 149). Isto faz com que o poema seja inteligível sem esforço para o leitor, que pode apreciar em seguida a mensagem terna que transmite a constância amorosa de Jacob. Veja-se, como amostra, a seguinte opinião de Agostinho de Campos, que insiste na candura verbal da composição:
Jacob não ficou desiludido e começou a servir Labão durante mais sete anos. As palavras finais do soneto, pronunciadas pela própria personagem emotivamente em estilo directo, manifestam o ânimo firme de Jacob, que exprime que estaria disposto a servir Labão ainda mais tempo para conseguir Raquel.
Sete anos de pastor Jacob servia apresenta, embora só em aparência, um estilo primacialmente descomplicado, sendo esta se calhar uma das causas principais da sua dilatada fama. É evidente que na configuração verbal do texto predomina, pelo menos no plano mais superficial, uma certa tendência à nudez retórica (Dasilva, 2001: 149). Isto faz com que o poema seja inteligível sem esforço para o leitor, que pode apreciar em seguida a mensagem terna que transmite a constância amorosa de Jacob. Veja-se, como amostra, a seguinte opinião de Agostinho de Campos, que insiste na candura verbal da composição:
Este soneto, quase todo narrativo, escrito em linguagem onde não se mistura uma só palavra culta e rara, e fechado com uma bela antítese que parece literata, mas encontra correspondências numerosas em tantas quadras nossas populares, é um drama do povo, e também para o povo, embora os cultos o admirem e devam admirar tecnicamente. O moço minhoto, aldeão e analfabeto, que tenha pensado em emigrar para longe, com a esperança de voltar ao fim de anos e casar-se com a rapariga que ama, filha do lavrador mais rico da terrinha, chorará com certeza, se ouvir ler esses versos, porque os pode compreender e sentir de ponta a ponta. (Camões, 1926: 232-233)
É necessário apontar, no entanto, que a excelência amorosa da personagem bíblica possui um desenvolvimento temático que, longe dessa simplicidade, se baseia em diferentes figuras, relacionadas nomeadamente com a ideia de um serviço sentimental que é irrefreável, mau grado todas as dificuldades.
Do ponto de vista estrutural, o soneto alicerça-se numa construção linear não isenta de forte tensão dramática. De facto, os quartetos veiculam a exposição do caso narrado, enquanto o primeiro terceto funciona como núcleo e o segundo terceto é remate. Quanto ao modelo construtivo, Sete anos de pastor Jacob servia faz parte do grupo de sonetos camonianos em que o discurso narrativo do emissor lírico é interrompido, num determinado verso, para inserir a voz de uma personagem. Por via de regra, este é um recurso técnico que costuma adquirir grande relevo na expansão do texto.
Sete anos de pastor Jacob servia é, com efeito, exemplo magnífico da irrupção de uma personagem para acabar o soneto com as suas palavras. O protagonista, após a narração que o emissor lírico realiza da sua história, intervém nos dois últimos versos a fim de explicitar uma fidelidade amorosa suprema, a despeito de todos os enganos. Além disso, o soneto fecha-se, como um universo completo, com a declaração de Jacob. O conteúdo desta, onde é fundamental o duplo significado literal e simbólico da acção verbal servir, remete para o começo do texto, na primeira quadra, em que o mesmo vocábulo aparece reiterado até três vezes.
Apesar de se afastar em muitos pormenores da história original, a fonte básica de Sete anos de pastor Jacob servia é, como foi dito, o episódio bíblico do Antigo Testamento que tem esta personagem como protagonista (Carreira, 1982: 47-49). Agostinho de Campos destacou esse aspecto:
É necessário apontar, no entanto, que a excelência amorosa da personagem bíblica possui um desenvolvimento temático que, longe dessa simplicidade, se baseia em diferentes figuras, relacionadas nomeadamente com a ideia de um serviço sentimental que é irrefreável, mau grado todas as dificuldades.
Do ponto de vista estrutural, o soneto alicerça-se numa construção linear não isenta de forte tensão dramática. De facto, os quartetos veiculam a exposição do caso narrado, enquanto o primeiro terceto funciona como núcleo e o segundo terceto é remate. Quanto ao modelo construtivo, Sete anos de pastor Jacob servia faz parte do grupo de sonetos camonianos em que o discurso narrativo do emissor lírico é interrompido, num determinado verso, para inserir a voz de uma personagem. Por via de regra, este é um recurso técnico que costuma adquirir grande relevo na expansão do texto.
Sete anos de pastor Jacob servia é, com efeito, exemplo magnífico da irrupção de uma personagem para acabar o soneto com as suas palavras. O protagonista, após a narração que o emissor lírico realiza da sua história, intervém nos dois últimos versos a fim de explicitar uma fidelidade amorosa suprema, a despeito de todos os enganos. Além disso, o soneto fecha-se, como um universo completo, com a declaração de Jacob. O conteúdo desta, onde é fundamental o duplo significado literal e simbólico da acção verbal servir, remete para o começo do texto, na primeira quadra, em que o mesmo vocábulo aparece reiterado até três vezes.
Apesar de se afastar em muitos pormenores da história original, a fonte básica de Sete anos de pastor Jacob servia é, como foi dito, o episódio bíblico do Antigo Testamento que tem esta personagem como protagonista (Carreira, 1982: 47-49). Agostinho de Campos destacou esse aspecto:
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Está [o episódio] no Génesis, capítulo XXIX. Mas Camões pôs de parte muitas circunstâncias que o estorvavam, e de todo o capítulo espremeu apenas o sumo de poesia eterna que ele contém. A poligamia de Jacob, a sua idade avançada de 77 anos, a menoridade de Raquel, a sua esterilidade posterior, a preferência que Lia afinal alcançou, apesar dos seus olhos ramelosos, por ser fecunda, todos estes e outros elementos prosaicos desaparecem, ficando no espírito e no sentimento do leitor ignorante das fontes a impressão de um moço pastor que ama, espera fielmente, e algum dia terá o prémio único, e a tudo preferido, da sua constância heróica e exemplar. (Camões, 1926: 116)
Este autor conclui que Camões simplificou, de maneira extraordinária, o tema bíblico, “amoldando-o ao seu intuito e ao seu génio” (Camões, 1926: 116). Le Gentil opinou, por sua vez, sobre a adaptação bíblica praticada no soneto: “Camões s’en empare et transforme cette médiocre aventure de harem en modèle de constance éprouvée” (Le Gentil, 1954: 131).
Conforme foi frisado por Maria de Lourdes Saraiva, Camões modifica em medida elevada a mensagem que, a partir do relato bíblico, a história de Jacob oferece: “Nem a linguagem nem as circunstâncias do relato bíblico aparecem reflectidas no soneto que, aliás, dá ao episódio um sentido que não se encontra no Génesis: o da constância do Amor” (Camões, 1980-1981: 168). Azevedo Filho expressou uma opinião afim:
Naturalmente, a motivação do soneto vem da Bíblia, mas o texto poético é criador por excelência e não pode ser lido, rigorosamente, à luz do texto histórico. No caso, a Bíblia é, apenas, um elemento subsidiário para a interpretação do texto literário, que mantém a sua autonomia estética. (Camões, 1989: 912)
Faria e Sousa esclareceu a diferença relativa à passagem do tempo que se percebe entre o episódio bíblico e o soneto. Verdadeiramente existe uma divergência no que diz respeito ao novo período que Jacob, para obter o amor de Lia, tem de servir Labão, mais sete anos no poema, enquanto se fala apenas de mais uma semana na Bíblia. Infelizmente, é impossível saber-se ao certo se Camões concebeu, de forma propositada, tal diferença. Não é de duvidar, porém, que assim conseguiu um extraordinário desenlace para o poema. Eis o perspicaz comentário de Faria e Sousa:
Dijo que aún sirviera más si no fuera el amor tan largo, y la vida tan corta. En parte, no parece, no conforma esto con lo que allí dice la Escritura. [...] Pues pareciéndole poco tiempo siete años, porque el amor era mucho, ahora dice el Poeta que le parecía mucho el tiempo, por ser mucho el amor. Pero eso de la Escritura cae sobre los siete años, y no sobre los catorce. Y aun no tendrá lugar este pensamiento del Poeta si se mirase bien lo que dice la Escritura: y es que viendo Jacob con la luz de la mañana, como había estado aquella noche con Lía, y no con Raquel, y quejándose a Labán, él le respondió que acabada la semana de aquel desposorio se desposaría con Raquel: y dice luego que Jacob con esto quedó contento, y a los nueve días casó con Raquel. Y pues a Jacob le parecieron pocos días los siete años de servicio por su Raquel, no tiene lugar este pensamiento del Poeta sobre parecerle muchos para tanto amor los otros siete, ya que entraba en ellos con entero recibo de ella: y mucho menos si se considera que él después de los segundos siete años de obligación, sirvió casi otros siete voluntariamente, con que vino a servir algunos veinte. (Camões, 1685: 75-76)
Azevedo Filho também ressaltou a disparidade entre o relato bíblico e o soneto: “Portanto, não foi necessário que se esgotasse o longo prazo de catorze anos para a plena realização do seu amor. Na verdade, foram necessários sete anos e uma semana” (Camões, 1989: 910). E Azevedo Filho acrescenta: “Realmente, o possível equívoco, na exegese do texto bíblico, gerou o extraordinário texto” (Camões, 1989: 911).
Quanto a outra possível fonte do soneto, há que lembrar, embora não sejam um modelo directo, alguns versos da canção S'i' 'l dissi mai, ch'i' vegna in odio a quella, de Petrarca, em que é citado concisamente o caso amoroso de Raquel e Lia (Petrarca, 1989: 754):
Este autor conclui que Camões simplificou, de maneira extraordinária, o tema bíblico, “amoldando-o ao seu intuito e ao seu génio” (Camões, 1926: 116). Le Gentil opinou, por sua vez, sobre a adaptação bíblica praticada no soneto: “Camões s’en empare et transforme cette médiocre aventure de harem en modèle de constance éprouvée” (Le Gentil, 1954: 131).
Conforme foi frisado por Maria de Lourdes Saraiva, Camões modifica em medida elevada a mensagem que, a partir do relato bíblico, a história de Jacob oferece: “Nem a linguagem nem as circunstâncias do relato bíblico aparecem reflectidas no soneto que, aliás, dá ao episódio um sentido que não se encontra no Génesis: o da constância do Amor” (Camões, 1980-1981: 168). Azevedo Filho expressou uma opinião afim:
Naturalmente, a motivação do soneto vem da Bíblia, mas o texto poético é criador por excelência e não pode ser lido, rigorosamente, à luz do texto histórico. No caso, a Bíblia é, apenas, um elemento subsidiário para a interpretação do texto literário, que mantém a sua autonomia estética. (Camões, 1989: 912)
Faria e Sousa esclareceu a diferença relativa à passagem do tempo que se percebe entre o episódio bíblico e o soneto. Verdadeiramente existe uma divergência no que diz respeito ao novo período que Jacob, para obter o amor de Lia, tem de servir Labão, mais sete anos no poema, enquanto se fala apenas de mais uma semana na Bíblia. Infelizmente, é impossível saber-se ao certo se Camões concebeu, de forma propositada, tal diferença. Não é de duvidar, porém, que assim conseguiu um extraordinário desenlace para o poema. Eis o perspicaz comentário de Faria e Sousa:
Dijo que aún sirviera más si no fuera el amor tan largo, y la vida tan corta. En parte, no parece, no conforma esto con lo que allí dice la Escritura. [...] Pues pareciéndole poco tiempo siete años, porque el amor era mucho, ahora dice el Poeta que le parecía mucho el tiempo, por ser mucho el amor. Pero eso de la Escritura cae sobre los siete años, y no sobre los catorce. Y aun no tendrá lugar este pensamiento del Poeta si se mirase bien lo que dice la Escritura: y es que viendo Jacob con la luz de la mañana, como había estado aquella noche con Lía, y no con Raquel, y quejándose a Labán, él le respondió que acabada la semana de aquel desposorio se desposaría con Raquel: y dice luego que Jacob con esto quedó contento, y a los nueve días casó con Raquel. Y pues a Jacob le parecieron pocos días los siete años de servicio por su Raquel, no tiene lugar este pensamiento del Poeta sobre parecerle muchos para tanto amor los otros siete, ya que entraba en ellos con entero recibo de ella: y mucho menos si se considera que él después de los segundos siete años de obligación, sirvió casi otros siete voluntariamente, con que vino a servir algunos veinte. (Camões, 1685: 75-76)
Azevedo Filho também ressaltou a disparidade entre o relato bíblico e o soneto: “Portanto, não foi necessário que se esgotasse o longo prazo de catorze anos para a plena realização do seu amor. Na verdade, foram necessários sete anos e uma semana” (Camões, 1989: 910). E Azevedo Filho acrescenta: “Realmente, o possível equívoco, na exegese do texto bíblico, gerou o extraordinário texto” (Camões, 1989: 911).
Quanto a outra possível fonte do soneto, há que lembrar, embora não sejam um modelo directo, alguns versos da canção S'i' 'l dissi mai, ch'i' vegna in odio a quella, de Petrarca, em que é citado concisamente o caso amoroso de Raquel e Lia (Petrarca, 1989: 754):
Per Rachel ò servito, et non per Lia;
né con altra saprei
viver; e sosterrei,
quando 'l ciel ne rappella,
girmen, con ella, in sul carro de Helia.
né con altra saprei
viver; e sosterrei,
quando 'l ciel ne rappella,
girmen, con ella, in sul carro de Helia.
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No conjunto de interpretações críticas que Sete anos de pastor Jacob servia tem recebido, Agostinho de Campos estimou que o soneto é um “apólogo da constância amorosa” (Camões, 1926: 116). Por seu turno, Sousa Rebelo sugeriu que se trata de um poema de misteriosa natureza: “O soneto de Camões que começa Sete anos de pastor Jacob servia é das suas composições líricas uma das que mais tem intrigado a crítica literária” (Rebelo, 1981: 437).
É preciso chamar a atenção para o juízo estético escassamente favorável que Sete anos de pastor Jacob servia mereceu de Faria e Sousa. Com efeito, o poema não suscitou a admiração incondicional do editor seiscentista, que viu no seu singelo desenvolvimento uma fraca razão para o sucesso que granjeou, especialmente na literatura espanhola:
Claramente se ve que es el argumento de este soneto al suceso de Jacob en sus amores con Raquel; y es el que de mi Poeta consigue más nombre en Castilla; y yo le tengo por de los medianos suyos, porque en los primeros doce versos no hay cosa considerable más de la limpieza en la relación desnuda del caso. Solamente los dos últimos (también no muy poéticos) contienen aquel aseo de que aun sirviera más de catorce años por merecer mejor Raquel, sino fuera la vida tan corta para un amor tan largo. Y de aquí se ve cuán poco entiende al Poeta quien celebra esto mucho, sin celebrar otros sonetos que en él hay total y justamente despreciadores de este. Yo fio que si le tuviéramos presente firmara esta sentencia. Mas no es de admirar, pues aun entre portugueses no falta lo propio teniendo ellos obligación de entender los escritos de su lengua mejor que los extraños. (Camões, 1685: 74)
Agostinho de Campos tentou tirar importância a esta opinião hostil de Faria e Sousa, explicando que a intenção do editor das Rimas várias era convencer os leitores espanhóis de que deviam ler outros sonetos camonianos de superior qualidade (Camões, 1926: 231).
Relativamente à sua fortuna, há que dizer que Sete anos de pastor Jacob servia representa uma composição extensamente conhecida, que pode disputar, de modo legítimo, o mérito de ser, em companhia de Alma minha gentil que te partiste, a peça lírica mais célebre de Camões, além da mais imitada (Dasilva, 2003). Entre os autores portugueses que se inspiraram neste soneto (Vasconcelos, 1910), deve citar-se António Barbosa Bacelar (Fénix Renascida), Miguel Leitão de Andrade (Miscelánea) e Francisco Manuel de Melo (Musas de Melodino). No entanto, o soneto teve maior número de imitadores em castelhano (Glaser, 1955).
No Manuscrito de la Biblioteca de Medinaceli ou Tonos castellanos, recolhido no Ensayo de una biblioteca española de libros raros y curiosos, de Bartolomé José Gallardo, há uma tradução anónima de Sete anos de pastor Jacob servia, em que falta o ultimo verso do primeiro terceto, muito fiel ao texto original (Gallardo, 1863):
É preciso chamar a atenção para o juízo estético escassamente favorável que Sete anos de pastor Jacob servia mereceu de Faria e Sousa. Com efeito, o poema não suscitou a admiração incondicional do editor seiscentista, que viu no seu singelo desenvolvimento uma fraca razão para o sucesso que granjeou, especialmente na literatura espanhola:
Claramente se ve que es el argumento de este soneto al suceso de Jacob en sus amores con Raquel; y es el que de mi Poeta consigue más nombre en Castilla; y yo le tengo por de los medianos suyos, porque en los primeros doce versos no hay cosa considerable más de la limpieza en la relación desnuda del caso. Solamente los dos últimos (también no muy poéticos) contienen aquel aseo de que aun sirviera más de catorce años por merecer mejor Raquel, sino fuera la vida tan corta para un amor tan largo. Y de aquí se ve cuán poco entiende al Poeta quien celebra esto mucho, sin celebrar otros sonetos que en él hay total y justamente despreciadores de este. Yo fio que si le tuviéramos presente firmara esta sentencia. Mas no es de admirar, pues aun entre portugueses no falta lo propio teniendo ellos obligación de entender los escritos de su lengua mejor que los extraños. (Camões, 1685: 74)
Agostinho de Campos tentou tirar importância a esta opinião hostil de Faria e Sousa, explicando que a intenção do editor das Rimas várias era convencer os leitores espanhóis de que deviam ler outros sonetos camonianos de superior qualidade (Camões, 1926: 231).
Relativamente à sua fortuna, há que dizer que Sete anos de pastor Jacob servia representa uma composição extensamente conhecida, que pode disputar, de modo legítimo, o mérito de ser, em companhia de Alma minha gentil que te partiste, a peça lírica mais célebre de Camões, além da mais imitada (Dasilva, 2003). Entre os autores portugueses que se inspiraram neste soneto (Vasconcelos, 1910), deve citar-se António Barbosa Bacelar (Fénix Renascida), Miguel Leitão de Andrade (Miscelánea) e Francisco Manuel de Melo (Musas de Melodino). No entanto, o soneto teve maior número de imitadores em castelhano (Glaser, 1955).
No Manuscrito de la Biblioteca de Medinaceli ou Tonos castellanos, recolhido no Ensayo de una biblioteca española de libros raros y curiosos, de Bartolomé José Gallardo, há uma tradução anónima de Sete anos de pastor Jacob servia, em que falta o ultimo verso do primeiro terceto, muito fiel ao texto original (Gallardo, 1863):
Si por Raquel, gentil zagala bella,
siete años de pastor Jacob servia,
si le engañaron con su hermana Lia,
y otros siete volvió a servir por ella.
Con esperanza al fin de poseella,
entretenido en verla cada día,
si mil sirviera y más, muy poco hacía;
pues con servir pensaba merecella.
¡Cuánto mayor amor será, señora,
servir sin esperanza ni aun los engaños,
[…]
Y cuánta más beldad mi alma adora,
pues que tengo por gloria en mí los daños
y mil años que os vea por un hora
siete años de pastor Jacob servia,
si le engañaron con su hermana Lia,
y otros siete volvió a servir por ella.
Con esperanza al fin de poseella,
entretenido en verla cada día,
si mil sirviera y más, muy poco hacía;
pues con servir pensaba merecella.
¡Cuánto mayor amor será, señora,
servir sin esperanza ni aun los engaños,
[…]
Y cuánta más beldad mi alma adora,
pues que tengo por gloria en mí los daños
y mil años que os vea por un hora
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Do soneto existe uma outra versão, mais afastada do texto de partida, que foi incluída pelo escritor espanhol Luis Vélez de Guevara na Comedia famosa de la hermosura de Raquel, obra que faz parte da colectânea Flor de comedias de diferentes autores, editada em Barcelona no ano de 1615 (Romero, 1981). O poema é interpretado, na jornada III, por um músico:
Siete años de pastor Jacob servia
al padre de Raquel, serrana bella,
mas no servía al padre, servía a ella,
que a ella sola por premio pretendía.
Los días en memoria de aquel día
pasava, contentándose con vella,
y el cauteloso padre, en lugar della,
por su amada Raquel le dava a Lía.
Viendo el triste pastor que con engaños
le niegan a Raquel, el bien que espera,
como si dél no fuere merecida.
buelve a servir de nuevo otros siete años,
y mil sirviera más, sinó tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
buelve a servir de nuevo otros siete años,
y mil sirviera más, sinó tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
Así como el ingenio en los grandes objetos no satisface, sino con un relevante encarecimiento, así en la voluntad suele ser tanta la intención del afecto que no satisface con menos que con una exagerada ponderación. Tuvo eminencia en ellas el inmortal Camões, pero ésta ha sido el blanco de sus aplausos; es soneto a Jacob, más enamorado cuanto más engañado. (Gracián, 1969: 220-221)
Carlos Romero descobriu novas traduções de Sete anos de pastor Jacob servia procedentes de diferentes manuscritos conservados na Biblioteca Nacional de Madrid: 3890 (fol. 74 v.), 3700 (fol. 205, r. e v.), 3920 (fol. 245 r.) e 4140 (fol. 11 r.) (Romero, 1981: 390). Esta é, por exemplo, a versão do manuscrito 3890:
Siete años de pastor Jacob servía
al padre de Raquel, serrana bella;
pero no sirve al padre, sirve a ella,
que a ella sola en premio pretendía.
Los días, en memoria de aquel día,
passava, contentándose con vella,
mas Labán, cauteloso, en lugar della,
yngrato a su lealtad le ha dado a Lía.
Viendo el triste pastor que por engaños
le quitan su Raquel, el bien que espera,
por tiempo, amor y fe tan merecida,
volvió a servir de nuevo otros siete años,
y mil sirviera más, sinó tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
Como aspecto surpreendente relacionado com a difusão do poema, cabe lembrar que foi postulada até a existência de uma versão de Sete anos de pastor Jacob servia feita pelo próprio rei Filipe II. No Panegírico por la poesía, de autoria controversa, editado em Montilla por Manuel de Payva em 1627, refere-se a notícia de que o monarca imitou o soneto. Teófilo Braga, nas últimas décadas do século XIX, recuperou a informação de Filipe II ter traduzido Sete anos de pastor Jacob servia para castelhano (Braga, 1889, 1891: 196-198).
Carolina Michaëlis pôs em destaque a recepção imediata que Sete anos de pastor Jacob servia teve em Espanha:
O soneto, ainda antes de ganhar publicidade, por meio da 1ª impressão das Rimas, em 1595, foi provàvelmente espalhado em numerosos apógrafos pelos reinos de Espanha, e passou os umbrais do palácio régio, se certa tradição fala verdade. Filipe II, Lope de Vega, Baltasar Gracián, Quevedo, Villegas, Alarcón, Trillo y Figueroa além-raia, aquém-raia Leitão de Andrada, Bacelar, e Francisco Manuel de Melo reconheceram o seu alto mérito e autenticaram-no citando, traduzindo, e imitando os seus dizeres. (Vasconcelos, 1889: 150)
Siete años de pastor Jacob servia
al padre de Raquel, serrana bella,
mas no servía al padre, servía a ella,
que a ella sola por premio pretendía.
Los días en memoria de aquel día
pasava, contentándose con vella,
y el cauteloso padre, en lugar della,
por su amada Raquel le dava a Lía.
Viendo el triste pastor que con engaños
le niegan a Raquel, el bien que espera,
como si dél no fuere merecida.
buelve a servir de nuevo otros siete años,
y mil sirviera más, sinó tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
buelve a servir de nuevo otros siete años,
y mil sirviera más, sinó tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
Así como el ingenio en los grandes objetos no satisface, sino con un relevante encarecimiento, así en la voluntad suele ser tanta la intención del afecto que no satisface con menos que con una exagerada ponderación. Tuvo eminencia en ellas el inmortal Camões, pero ésta ha sido el blanco de sus aplausos; es soneto a Jacob, más enamorado cuanto más engañado. (Gracián, 1969: 220-221)
Carlos Romero descobriu novas traduções de Sete anos de pastor Jacob servia procedentes de diferentes manuscritos conservados na Biblioteca Nacional de Madrid: 3890 (fol. 74 v.), 3700 (fol. 205, r. e v.), 3920 (fol. 245 r.) e 4140 (fol. 11 r.) (Romero, 1981: 390). Esta é, por exemplo, a versão do manuscrito 3890:
Siete años de pastor Jacob servía
al padre de Raquel, serrana bella;
pero no sirve al padre, sirve a ella,
que a ella sola en premio pretendía.
Los días, en memoria de aquel día,
passava, contentándose con vella,
mas Labán, cauteloso, en lugar della,
yngrato a su lealtad le ha dado a Lía.
Viendo el triste pastor que por engaños
le quitan su Raquel, el bien que espera,
por tiempo, amor y fe tan merecida,
volvió a servir de nuevo otros siete años,
y mil sirviera más, sinó tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
Como aspecto surpreendente relacionado com a difusão do poema, cabe lembrar que foi postulada até a existência de uma versão de Sete anos de pastor Jacob servia feita pelo próprio rei Filipe II. No Panegírico por la poesía, de autoria controversa, editado em Montilla por Manuel de Payva em 1627, refere-se a notícia de que o monarca imitou o soneto. Teófilo Braga, nas últimas décadas do século XIX, recuperou a informação de Filipe II ter traduzido Sete anos de pastor Jacob servia para castelhano (Braga, 1889, 1891: 196-198).
Carolina Michaëlis pôs em destaque a recepção imediata que Sete anos de pastor Jacob servia teve em Espanha:
O soneto, ainda antes de ganhar publicidade, por meio da 1ª impressão das Rimas, em 1595, foi provàvelmente espalhado em numerosos apógrafos pelos reinos de Espanha, e passou os umbrais do palácio régio, se certa tradição fala verdade. Filipe II, Lope de Vega, Baltasar Gracián, Quevedo, Villegas, Alarcón, Trillo y Figueroa além-raia, aquém-raia Leitão de Andrada, Bacelar, e Francisco Manuel de Melo reconheceram o seu alto mérito e autenticaram-no citando, traduzindo, e imitando os seus dizeres. (Vasconcelos, 1889: 150)
46
A estudiosa menciona imitações, como se vê, em sonetos de Francisco de Trillo y Figueroa e Lope de Vega, entre outros. Além disso, faz referência, com cepticismo, à hipótese de Filipe II ter realizado uma paráfrase de Sete anos de pastor Jacob servia:
Contou-se no séc. XVII e repetiu-se em nossos dias o bonito conto, bem inventado ainda que mal possa ser verídico, que o déspota vencedor Filipe II, vencido pela maestria do grande Lusitano, ao qual admirava e desejava honrar, glosara o nosso celebrado Soneto. A Glosa devia conter forçosamente uma tradução do modelo português. Portanto pode-se perguntar se seria de Filipe II a tradução recolhida em parte pelo coleccionador do manuscrito Gallardo e em parte aproveitado por Alarcón. Impossível responder enquanto não aparecer a decantada Glosa real –que por ora não é mais que um mito. (Vasconcelos, 1889: 158)
Carolina Michaëlis voltou a ocupar-se, no artigo “Investigações sobre sonetos e sonetistas portugueses e castelhanos”, da difusão de Sete anos de pastor Jacob servia em Espanha (Vasconcelos, 1910). A erudita alemã reproduz os poemas, já citados atrás, de Trillo y Figueroa, Luis de Ribera e Lope de Vega. Eis a versão deste último autor:
Con los desseos de Raquel servia
un nieto de Abrahan a un suegro ayrado,
llevando su esperança y su ganado
de un año en otro, y de uno en otro dia.
Deseaba a Raquel que hablaba y via,
tan contacto del mal de su cuydado
que de la possession de Lia cansado
más que el amor le atormentava Lia.
Tan corto premio del engaño arguye
que aunque puede mentir la confiança
más estima Jacob el bien que huye;
y lo que espera, más que lo que alcança,
que la engañosa possession destruye
lo que entretiene el bien en esperança.
Conhece-se uma versão Sete anos de pastor Jacob servia realizada por Francisco de Quevedo. Apareceu na edição póstuma Las tres musas últimas. Segunda cumbre del Parnaso español, vinda a lume em Madrid no ano de 1670. Este texto foi transcrito por Lamberto Gil, no século XIX, na sua tradução dos poemas líricos camonianos (Camões, 1818):
Siete años de pastor servia
al padre de Raquel, serrana bella;
mas no servia á él, servia á ella,
que á ella sola por premio pretendia.
Los dias, esperando el feliz dia,
pasaba, contentándose con vella:
mas Laban cauteloso en lugar de ella,
faltando á su palabra, le dió á Lia.
Él viendo que le quitan con engaños
á la que tantos años há que espera,
como si no estuviera merecida,
volvió á servir de nuevo otros siete años,
y aun serviria, si no tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
Contou-se no séc. XVII e repetiu-se em nossos dias o bonito conto, bem inventado ainda que mal possa ser verídico, que o déspota vencedor Filipe II, vencido pela maestria do grande Lusitano, ao qual admirava e desejava honrar, glosara o nosso celebrado Soneto. A Glosa devia conter forçosamente uma tradução do modelo português. Portanto pode-se perguntar se seria de Filipe II a tradução recolhida em parte pelo coleccionador do manuscrito Gallardo e em parte aproveitado por Alarcón. Impossível responder enquanto não aparecer a decantada Glosa real –que por ora não é mais que um mito. (Vasconcelos, 1889: 158)
Carolina Michaëlis voltou a ocupar-se, no artigo “Investigações sobre sonetos e sonetistas portugueses e castelhanos”, da difusão de Sete anos de pastor Jacob servia em Espanha (Vasconcelos, 1910). A erudita alemã reproduz os poemas, já citados atrás, de Trillo y Figueroa, Luis de Ribera e Lope de Vega. Eis a versão deste último autor:
Con los desseos de Raquel servia
un nieto de Abrahan a un suegro ayrado,
llevando su esperança y su ganado
de un año en otro, y de uno en otro dia.
Deseaba a Raquel que hablaba y via,
tan contacto del mal de su cuydado
que de la possession de Lia cansado
más que el amor le atormentava Lia.
Tan corto premio del engaño arguye
que aunque puede mentir la confiança
más estima Jacob el bien que huye;
y lo que espera, más que lo que alcança,
que la engañosa possession destruye
lo que entretiene el bien en esperança.
Conhece-se uma versão Sete anos de pastor Jacob servia realizada por Francisco de Quevedo. Apareceu na edição póstuma Las tres musas últimas. Segunda cumbre del Parnaso español, vinda a lume em Madrid no ano de 1670. Este texto foi transcrito por Lamberto Gil, no século XIX, na sua tradução dos poemas líricos camonianos (Camões, 1818):
Siete años de pastor servia
al padre de Raquel, serrana bella;
mas no servia á él, servia á ella,
que á ella sola por premio pretendia.
Los dias, esperando el feliz dia,
pasaba, contentándose con vella:
mas Laban cauteloso en lugar de ella,
faltando á su palabra, le dió á Lia.
Él viendo que le quitan con engaños
á la que tantos años há que espera,
como si no estuviera merecida,
volvió á servir de nuevo otros siete años,
y aun serviria, si no tuviera
para tan largo amor tan corta vida.
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No concernente aos ecos de Sete anos de pastor Jacob servia em território espanhol, Edward Glaser exumou mais poemas de Lope de Vega e Miguel de Barrios, além de outros autores (Glaser, 1955). Esta é uma nova versão do autor de Laurel de Apolo:
a Lia goza, y a Raquel espera
Sirvio Jacob los siete largos años,
breves, si el fin qual la aspereza fuera,
otros siete años despues, llorando engaños.
Assi guardan palabra los estraños,
pero en efecto vive, y considera,
que la podra gozar antes que muera,
y que tuvieron termino sus daños.
Triste de mi, sin límite que mida
lo que un engaño al sufrimiento cuesta,
y sin remedio que el agravio pida.
Ay de aquel alma a padecer dispuesta,
que espera su Raquel en la otra vida,
y tiene a Lia para siempre en esta.
Convém interrogar-se sobre as causas do sucesso indiscutível de Sete anos de pastor Jacob servia. Os motivos para justificar essa vasta recepção têm a ver, provavelmente, com a singeleza do fluir narrativo dos seus versos, carentes de subtilezas verbais, de grande limpidez e, enfim, de fácil compreensão para o leitor. Sete anos de pastor Jacob servia acaba, aliás, com um desfecho repleto de lirismo, concentrado magistralmente nos dois últimos decassílabos, os quais revelam, com sublime força dramática, a intensidade de uma paixão amorosa constante e paciente.
Em termos editoriais, há que ressaltar que Sete anos de Pastor Jacob servia veio a lume nas Rhythmas (Camões, 1595) e nas Rimas (Camões, 1598). A partir daqui, o soneto foi incluído em todas as edições da poesia camoniana. No âmbito da tradição manuscrita, além disso, Sete anos de pastor Jacob servia dispõe de várias versões. Além de figurar no “Índice” do Cancioneiro do Padre Pedro Ribeiro, aparece reproduzido no Cancionero de la Real Academia de la Historia (Cruz, 1971), no Manuscrito Juromenha, no Cancioneiro de Cristóvão Borges (Askins, 1979), no Manuscrito 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo e no Cancionero de la Biblioteca del Escorial (Cruz, 1971).
No que diz respeito às relações estemáticas destes testemunhos, Azevedo Filho sugeriu que é possível agrupar as lições em duas famílias, especialmente a partir da presença no verso 4 das palavras soldada ou prémio (Camões, 1989: 887-888). A primeira família, com a solução soldada, reúne as versões do Cancioneiro de Cristóvão Borges, do Cancionero de la Biblioteca del Escorial e do Manuscrito Juromenha. A segunda família, com o vocábulo prémio, está constituída pelas versões do Cancionero de la Real Academia de la Historia e do Manuscrito 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Do ponto de vista autoral, Sete anos de Pastor Jacob servia é um soneto incontroversamente camoniano. Tem dois testemunhos quinhentistas impressos e vários documentos manuscritos com indicação de autoria: o “Índice” do Cancioneiro do Padre Pedro Ribeiro, o Cancionero de la Real Academia de la Historia e o Manuscrito Juromenha. Contrariamente, no Cancioneiro de Cristóvão Borges, no Manuscrito 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo e no Cancionero de la Biblioteca del Escorial o soneto aparece sem nome do autor. Seja como for, a autoria de Camões relativa a Sete anos de pastor Jacob servia nunca foi desmentida por nenhum documento.
Na sua edição, Costa Pimpão seleccionou como texto de base, mais uma vez, a versão impressa (Camões, 1944). Azevedo Filho escolheu, pelo contrário, a versão reproduzida no Cancioneiro de Cristóvão Borges, manuscrito datado em 1578, ou seja, em vida de Camões (Azevedo Filho, 1991: 26). É por isso que Azevedo Filho julgou de superior autenticidade a lição soldada, em lugar de prémio (Camões, 1989: 892-893).
Metricamente, Sete anos de Pastor Jacob servia apresenta quatro rimas e esquema ABBA ABBA CDE CDE. Todos os versos aparecem acentuados na 6ª e na 10ª sílabas. Cabe estabelecer algum tipo de analogia entre as rimas das quadras e, quanto à sua arquitectura construtiva, o ritmo do soneto. Desta feita, é possível ressaltar o paralelismo das rimas dos quartetos, enquanto os tercetos, com um esquema de rimas diferente, determinam uma rápida evolução em direcção ao desfecho.
a Lia goza, y a Raquel espera
Sirvio Jacob los siete largos años,
breves, si el fin qual la aspereza fuera,
otros siete años despues, llorando engaños.
Assi guardan palabra los estraños,
pero en efecto vive, y considera,
que la podra gozar antes que muera,
y que tuvieron termino sus daños.
Triste de mi, sin límite que mida
lo que un engaño al sufrimiento cuesta,
y sin remedio que el agravio pida.
Ay de aquel alma a padecer dispuesta,
que espera su Raquel en la otra vida,
y tiene a Lia para siempre en esta.
Convém interrogar-se sobre as causas do sucesso indiscutível de Sete anos de pastor Jacob servia. Os motivos para justificar essa vasta recepção têm a ver, provavelmente, com a singeleza do fluir narrativo dos seus versos, carentes de subtilezas verbais, de grande limpidez e, enfim, de fácil compreensão para o leitor. Sete anos de pastor Jacob servia acaba, aliás, com um desfecho repleto de lirismo, concentrado magistralmente nos dois últimos decassílabos, os quais revelam, com sublime força dramática, a intensidade de uma paixão amorosa constante e paciente.
Em termos editoriais, há que ressaltar que Sete anos de Pastor Jacob servia veio a lume nas Rhythmas (Camões, 1595) e nas Rimas (Camões, 1598). A partir daqui, o soneto foi incluído em todas as edições da poesia camoniana. No âmbito da tradição manuscrita, além disso, Sete anos de pastor Jacob servia dispõe de várias versões. Além de figurar no “Índice” do Cancioneiro do Padre Pedro Ribeiro, aparece reproduzido no Cancionero de la Real Academia de la Historia (Cruz, 1971), no Manuscrito Juromenha, no Cancioneiro de Cristóvão Borges (Askins, 1979), no Manuscrito 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo e no Cancionero de la Biblioteca del Escorial (Cruz, 1971).
No que diz respeito às relações estemáticas destes testemunhos, Azevedo Filho sugeriu que é possível agrupar as lições em duas famílias, especialmente a partir da presença no verso 4 das palavras soldada ou prémio (Camões, 1989: 887-888). A primeira família, com a solução soldada, reúne as versões do Cancioneiro de Cristóvão Borges, do Cancionero de la Biblioteca del Escorial e do Manuscrito Juromenha. A segunda família, com o vocábulo prémio, está constituída pelas versões do Cancionero de la Real Academia de la Historia e do Manuscrito 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Do ponto de vista autoral, Sete anos de Pastor Jacob servia é um soneto incontroversamente camoniano. Tem dois testemunhos quinhentistas impressos e vários documentos manuscritos com indicação de autoria: o “Índice” do Cancioneiro do Padre Pedro Ribeiro, o Cancionero de la Real Academia de la Historia e o Manuscrito Juromenha. Contrariamente, no Cancioneiro de Cristóvão Borges, no Manuscrito 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo e no Cancionero de la Biblioteca del Escorial o soneto aparece sem nome do autor. Seja como for, a autoria de Camões relativa a Sete anos de pastor Jacob servia nunca foi desmentida por nenhum documento.
Na sua edição, Costa Pimpão seleccionou como texto de base, mais uma vez, a versão impressa (Camões, 1944). Azevedo Filho escolheu, pelo contrário, a versão reproduzida no Cancioneiro de Cristóvão Borges, manuscrito datado em 1578, ou seja, em vida de Camões (Azevedo Filho, 1991: 26). É por isso que Azevedo Filho julgou de superior autenticidade a lição soldada, em lugar de prémio (Camões, 1989: 892-893).
Metricamente, Sete anos de Pastor Jacob servia apresenta quatro rimas e esquema ABBA ABBA CDE CDE. Todos os versos aparecem acentuados na 6ª e na 10ª sílabas. Cabe estabelecer algum tipo de analogia entre as rimas das quadras e, quanto à sua arquitectura construtiva, o ritmo do soneto. Desta feita, é possível ressaltar o paralelismo das rimas dos quartetos, enquanto os tercetos, com um esquema de rimas diferente, determinam uma rápida evolução em direcção ao desfecho.
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Para complementar o comentário de Sete anos de Pastor Jacob servia, oferecemos, seguidamente, um conjunto de anotações a respeito de palavras, sintagmas e versos da composição:
1-4 Na primeira quadra, é notório na voz narrativa que relata a história de Jacob o jogo semântico com as palavras bela e ela, em posição de rima, que patenteiam a formosura de Raquel. Deve acrescentar-se, aliás, a repetição vocabular da acção verbal servia, que aparece, no reduzido espaço da estrofe inicial, até três vezes com a mesma forma.
1 servia No Cancionero de la Real Academia de la Historia consta a solução servira, que não constitui rima perfeita com pretendia.
1-4 Na primeira quadra, é notório na voz narrativa que relata a história de Jacob o jogo semântico com as palavras bela e ela, em posição de rima, que patenteiam a formosura de Raquel. Deve acrescentar-se, aliás, a repetição vocabular da acção verbal servia, que aparece, no reduzido espaço da estrofe inicial, até três vezes com a mesma forma.
1 servia No Cancionero de la Real Academia de la Historia consta a solução servira, que não constitui rima perfeita com pretendia.
3-4 a ela... a ela A disposição retórica da primeira quadra não acaba com os elementos estilísticos acima referidos, já que é preciso advertir a anadiplose formada pela dupla concorrência do sintagma a ela, que destaca Raquel como único propósito que, na qualidade de prémio, o serviço do pastor persegue.
3 mas não servia ao pai, servia a ela Faria e Sousa interpretou nos seguintes termos o sentido deste verso: “Esto sucede a todos los que sirven, porque si no sirvieran al premio, no sirvieran a quien le ha de dar; y Raquel aquí era el premio que Jacob esperaba de Labán a quien servía por ella” (Camões, 1685: 75).
4 por soldada pretendia O vocábulo soldada tem especial relevo quanto às variantes textuais do soneto. De um ponto de vista geral, Lawton indicou, não por acaso, que os problemas ecdóticos de Sete anos de pastor Jacob servia são de grande importância: “On voit ainsi qu'il n'y a aucun vers de ce sonnet qui n'ait subi une modification, tantôt légère, tantôt importante, et qu'à tout prendre, il y a pratiquement autant de versions qu'il y a des éditions” (Lawton, 1979: 720).
Como foi apontado, existem cinco documentos manuscritos que recolhem o soneto, para além de estar o seu incipit no “Índice” do Cancioneiro do Padre Pedro Ribeiro. Através da análise dos cancioneiros, pode determinar-se a constituição de duas famílias textuais que divergem, nomeadamente, na diferente lição do vocábulo mais duvidoso do texto, soldada ou prémio, localizado justamente neste verso. No Cancioneiro de Cristóvão Borges, no Cancionero de la Biblioteca del Monasterio de San Lorenzo del Escorial e no Manuscrito Juromenha lê-se o termo soldada, enquanto no Cancionero de la Real Academia de la Historia e no Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo aparece a palavra prémio, a mesma que figura na tradição impressa das Rhythmas e das Rimas varias (Camões, 1989: 887-903). Para Azevedo Filho, soldada é um “termo mais realista e mais adequado ao contexto mitológico-bíblico do poema”, enquanto prémio é um “termo literariamente mais nobre e menos realista” (Camões, 1989: 893).
No mais, Azevedo Filho considerou que o vocábulo soldada serve para explicar a solução prémio, de acordo com o princípio textual lectio quae alterius originem explicat potior: “Com efeito, se Camões tivesse escrito “prémio”, dificilmente poderia ocorrer, a qualquer copista inovador, a substituição de tal palavra por “soldada”, sendo o contrário perfeitamente compreensível, com a suposta e discutível finalidade de “melhorar” literariamente o verso” (Camões, 1989: 893).
5 Os dias na esperança de um só dia A insistência amorosa de Jacob é expressa, uma outra vez, mediante a epanadiplose que ocupa este verso. Com essa figura retórica, comunica-se a vivência psicológica de um amplo período temporal, com exactidão sete anos, que se torna menor tendo em vista a ilusão que a personagem espera ver materializada.
Faria e Sousa acentuou que esta fórmula expressiva foi utilizada por Camões noutros trechos da sua obra lírica: “Esto de días por un día, y de día en día, y de año en año, usa el Poeta algunas veces” (Camões, 1685: 75). A este respeito, o editor seiscentista apresenta amostras numerosas tiradas de composições pertencentes a diferentes géneros. Além disso, Faria e Sousa glosou assim o verso: “Por el día alegre del premio, se sufren los tristes días de la servidumbre. Así Jacob iba contando días hasta llegar el señalado. Dichoso él que tenía día señalado para el premio, porque lo ordinario es en los señores no conocer día de premio” (Camões, 1685: 75).
6. passava, contentando-se com vê-la No Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo aparece, em lugar de passava, a lição gastava. Alfredo Margarido observou neste verso um elemento ideológico da filosofia amorosa neoplatónica: “Aqui encontramos a lição neoplatónica do Renascimento, provavelmente através de Marcelo Ficino, sendo a vista e a visão os elementos essenciais por meio dos quais o mundo e os homens adquirem a sua estrutura” (Margarido, 1984: 19). Faria e Sousa, por seu turno, realizou uma leitura mais prosaica: “Los amantes son como los gatos: el gato si ve lo que desea alcanzar, aunque ve que no puede alcanzarlo, allí se está mirándolo un día entero, de modo que parece se satisface con la vista” (Camões, 1685: 75).
7-8 porém o pai... lhe dava Lia É na parte intermédia desta segunda estrofe que, no relato da história amorosa de Jacob, surge um importante ponto de inflexão. Com efeito, como é salientado através da conjunção adversativa porém, o pastor não pôde conseguir Raquel como recompensa para a sua esforçada fidelidade, porque Labão resolveu conceder-lhe Lia. Deve reparar-se na equilibrada contraposição estabelecida entre as duas mulheres no verso 8, que ilustra o seu inverso destino. Se até agora a história de Jacob já se mostrava reveladora como exemplo de firmeza amorosa, é a partir deste novo detalhe argumental que o rumo temático do soneto irá avançar nos dois tercetos em direcção ao desenlace. Textualmente, deve dizer-se que, como conjunção adversativa, no Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo está mas no início do verso, em substituição de porém.
8 em lugar de Raquel, lhe dava Lia De modo isolado, no Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo reproduz-se o verso com a seguinte lição: em vez de lhe dar Raquel lhe dava Lia. Há que indicar que o verso conta assim com mais uma sílaba.
9 o triste pastor A mudança produzida no terceto inicial com a decisão de Labão faz com que se refira, em primeiro lugar, a reacção que esta suscita no protagonista, caracterizado com o adjectivo triste, depois de ter comprovado que o seu sacrifício não obteve o prémio merecido. De novo, este verso aparece com uma solução diferente no Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo: Ele vendo o fim de seus enganos. Desta maneira, o verso dispõe apenas de nove sílabas, o que constitui um erro flagrante.
10 lhe fora assi negada sua pastora Mais uma vez, o Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo apresenta, de forma individual, uma lição divergente, acrescentando neste caso uma sílaba ao verso: com lhe ser assi negada sua pastora.
11 como se... No Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo esta fórmula é substituída por como que.
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12 tornando já a servir outros sete anos A intenção espontânea de Jacob será ficar às ordens de Labão outros sete anos, aqui anunciada pela voz narrativa retomando a acção verbal servir, que tinha sido repetida até três vezes na primeira quadra. Esta asseveração provoca que a experiência de Jacob seja definitivamente exemplar.
Faria e Sousa, a propósito do verso, insistiu na diferença perceptível entre o relato bíblico e o soneto camoniano quanto ao tempo do serviço de Jacob: “Providentemente dijo el Poeta que Jacob empezó a servir otros siete años, para merecer a Raquel, porque algunos piensan sirvió catorce primero de alcanzarla, y no es así; porque del capítulo citado, consta que al fin de la primera semana de casado con Lía, casó con Raquel, de consentimiento de su padre, con obligación de servir por ella otros siete años, como lo advierte San Jerónimo” (Camões, 1685: 75).
De uma perspectiva textual, há que indicar que a lição do verso reproduzida na edição das Rhythmas de 1595 difere de todos os testemunhos manuscritos: tornava já a servir outros set’anos, no Cancionero de la Real Academia de la Historia; começou a servir outros sete anos, no Ms. 2209 do Arquivo Nacional da Torre do Tombo; tornando já a servir outros sete anos, no Cancioneiro de Cristóvão Borges; tornou ainda a servir outros sete anos, no Cancionero de la Biblioteca del Monasterio de San Lorenzo del Escorial; e, enfim, tornou a a servir outros sete anos, no Manuscrito Juromenha.
13-14 A ênfase hiperbólica dos dois últimos versos, que recolhem sentenciosamente a voz directa do protagonista, reforça a mensagem, expressa no soneto, de um sentimento amoroso sólido e tenaz, imutável na sua excelência. Filgueira Valverde chamou a atenção para o fecho do soneto, motivo principal, em seu entender, do seu sucesso: “A causa do seu êxito tem que procurar-se, sobretudo, na sua diafaneidade. O curso narrativo flui, sem tropeços, livre de reflexões, e quase totalmente despido de todo o ornato retórico, até acabar por suspender-se na antinomia final, talvez a mais funda e sentida das muitas que saíram da pena de Camões” (Filgueira Valverde, 1981: 154).
Este fecho magistral é um aspecto que Carolina Michaëlis já tinha salientado como mérito fulcral de Sete anos de pastor Jacob servia: “Porque, força é dizê-lo, o que despertou o entusiasmo do público, o que feriu o ouvido fino e apurado dos conhecedores, decidindo a sorte do Soneto, foi exactamente, além do exórdio sete anos de pastor Jacob servia, a cadência final em que o patriarca, longe de arrepender-se dos anos mal gastos em serviço de Labão, exclama mais servira, se não fora / para tão longo amor tão curta a vida!” (Vasconcelos, 1889: 149).
13 dezia: –Mais servir(i)a, se não fora É preciso indicar as lições diversas transcritas no Cancioneiro de Cristóvão Borges e no Cancionero de la Biblioteca del Monasterio de San Lorenzo del Escorial, respectivamente dezia mais serviria se não fora e e querendo mais servir, se não fora.
14 p[e]ra tão longo(s) a[m]o[r] tão curta vida No Cancionero de la Biblioteca del Monasterio de San Lorenzo del Escorial está a lição pera tamanho Amor tão curta a vida, muito diferente no que diz respeito àquilo que figura nos restantes testemunhos manuscritos. Finalmente, Faria e Sousa aduziu que a oposição conceptual incluída no verso é habitual em muitos autores: “Juguete es frecuente en los Poetas, lo de largo y corto, o breve” (Camões, 1685: 76). O editor das Rimas várias cita, quanto a isso, abundantes passos da obra camoniana.
Referencias
Askins, Arthur Lee-Francis (1979): The Cancioneiro de Cristóvão Borges, Berkeley, University of California Press.
Azevedo Filho, Leodegário A. de (1991): Introdução à Lírica de Camões, Lisboa, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa.
Braga, Teófilo (1889): Um Soneto de Camões, glosado por Felipe II, Lisboa, Imprensa Nacional.
--- (1891): Camões e o Sentimento Nacional, Porto, Lugan & Genelioux.
Camões, Luís de (1595): Rhythmas, Lisboa, Manoel de Lyra. À custa de Estêvão Lopes mercador de libros.
--- (1598): Rimas, Lisboa, Pedro Crasbeeck. À custa de Estêvão Lopes mercador de libros.
--- (1685): Rimas várias, t. I e II, s.l., Imprenta de Teotônio Dâmaso de Melo. Comentadas por Manuel de Faria y Sousa.
--- (1818): Obras poéticas de Luís de Camões que tradujo al castellano Don Lamberto Gil, Madrid, L. P. Villaverde.
--- (1926): Camões Lírico, IV. Sonetos Escolhidos, Paris - Lisboa - Porto - Rio de Janeiro, Livrarias Aillaud e Bertrand - Livraria Chardron - Livraria Francisco Alves. Edição da Antologia Portuguesa organizada por Agostinho de Campos.
--- (1932): Lírica, Coimbra, Imprensa da Universidade. Edição crítica pelo Dr. José Maria Rodrigues e Afonso Lopes Vieira.
--- (1944): Rimas, Barcelos, Companhia Editora do Minho. Texto estabelecido, revisto e prefaciado por Álvaro Júlio da Costa Pimpão.
--- (1946): Obras completas. Poesia Lírica, Lisboa, Sá da Costa. Prefácio e notas do Prof. Hernâni Cidade. 2 vols.
--- (1963): Obra Completa, Rio de Janeiro, G. B. Companhia Aguilar Editora. Organização, introdução, comentários e anotações do Prof. Antônio Salgado Júnior.
--- (1980): Sonetos de Camões. 'Corpus' dos Sonetos Camonianos, Paris - Rio de Janeiro, Centre Culturel Portugais - Fundação Casa de Rui Barbosa. Edição e notas por Cleonice Serôa da Motta Berardinelli.
--- (1980-1981): Luís de Camões, Lírica completa, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Prefácio e notas de Maria de Lurdes Saraiva. 3 vols.
--- (1985): Lírica de Camões. 1. História, metodologia, corpus, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Texto estabelecido à luz da tradição manuscrita, em confronto com a tradição impressa, por Leodegário A. de Azevedo Filho.
--- (1987): Lírica de Camões. 2. Sonetos, t. I, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Texto estabelecido à luz da tradição manuscrita, em confronto com a tradição impressa, por Leodegário A. de Azevedo Filho.
--- (1989): Lírica de Camões. 2. Sonetos, t. II, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Texto estabelecido à luz da tradição manuscrita, em confronto com a tradição impressa, por Leodegário A. de Azevedo Filho.
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Le Gentil, Georges (1954): Camoëns, Paris, Hatier-Boivin.
Margarido, Alfredo (1984): “Uma leitura antropológica do soneto de Camões Sete anos de pastor Jacó servia”, Colóquio-Letras, 81, pp. 16-23.
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Vasconcelos, Carolina Michäelis de (1889): “Sete anos de pastor Jacob servia”, Circulo Camoniano, I, pp. 149-159; depois publicado em Dispersos Originais Portugueses. III: Estudos Camonianos, Lisboa, Revista Ocidente, s.a., pp. 39-46.
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--- (1891): Camões e o Sentimento Nacional, Porto, Lugan & Genelioux.
Camões, Luís de (1595): Rhythmas, Lisboa, Manoel de Lyra. À custa de Estêvão Lopes mercador de libros.
--- (1598): Rimas, Lisboa, Pedro Crasbeeck. À custa de Estêvão Lopes mercador de libros.
--- (1685): Rimas várias, t. I e II, s.l., Imprenta de Teotônio Dâmaso de Melo. Comentadas por Manuel de Faria y Sousa.
--- (1818): Obras poéticas de Luís de Camões que tradujo al castellano Don Lamberto Gil, Madrid, L. P. Villaverde.
--- (1926): Camões Lírico, IV. Sonetos Escolhidos, Paris - Lisboa - Porto - Rio de Janeiro, Livrarias Aillaud e Bertrand - Livraria Chardron - Livraria Francisco Alves. Edição da Antologia Portuguesa organizada por Agostinho de Campos.
--- (1932): Lírica, Coimbra, Imprensa da Universidade. Edição crítica pelo Dr. José Maria Rodrigues e Afonso Lopes Vieira.
--- (1944): Rimas, Barcelos, Companhia Editora do Minho. Texto estabelecido, revisto e prefaciado por Álvaro Júlio da Costa Pimpão.
--- (1946): Obras completas. Poesia Lírica, Lisboa, Sá da Costa. Prefácio e notas do Prof. Hernâni Cidade. 2 vols.
--- (1963): Obra Completa, Rio de Janeiro, G. B. Companhia Aguilar Editora. Organização, introdução, comentários e anotações do Prof. Antônio Salgado Júnior.
--- (1980): Sonetos de Camões. 'Corpus' dos Sonetos Camonianos, Paris - Rio de Janeiro, Centre Culturel Portugais - Fundação Casa de Rui Barbosa. Edição e notas por Cleonice Serôa da Motta Berardinelli.
--- (1980-1981): Luís de Camões, Lírica completa, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Prefácio e notas de Maria de Lurdes Saraiva. 3 vols.
--- (1985): Lírica de Camões. 1. História, metodologia, corpus, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Texto estabelecido à luz da tradição manuscrita, em confronto com a tradição impressa, por Leodegário A. de Azevedo Filho.
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Romero, Carlos (1981): “Dos notas sobre Camoens y Vélez de Guevara”, em Giuseppe Bellini, ed. Aspetti e Problemi delle Letterature Iberiche (Studi offerti a Franco Meregalli), Roma, Bulzoni editore, pp. 386-391.
Vasconcelos, Carolina Michäelis de (1889): “Sete anos de pastor Jacob servia”, Circulo Camoniano, I, pp. 149-159; depois publicado em Dispersos Originais Portugueses. III: Estudos Camonianos, Lisboa, Revista Ocidente, s.a., pp. 39-46.
--- (1910): “Investigações sobre sonetos e sonetistas portugueses e castelhanos”, Revue Hispanique, XXII, pp. 509-614.
Xosé Manuel Dasilva Fernández
Universidade de Vigo
50
Homenagem Poética
- Um português adoçado
Ana Hartherly - Leodegário,O mestre
Albano Martins - Momento Singular
Cláudia Azevedo - Fernando Pessoa para Leodegário
Júlio Carvalho - Carta a Leo
Marcus Vinícius Quiróga - Uma página para lembrar: O professor, o homem, a obra
Marina Machado Rodrigues - Profissionalismo e didatismo
Monica Rector - A crítica textual em Luís António Verney
Sebastião Pinho - Conversa em casa do poeta João Cabral de Melo
Nicolás Extremera Tapia - A Morte enquanto luto da vida
Antônio Sérgio Mendonça - O Cancioneiro peninsular e o romanceiro nordestino em Ariano Suassuna
Luisa Trias Folch - Corte e literatura no renascimento
Rita Marnoto - Uma jóia da bibliografia camoniana
Vítor Aguiar e Silva - O soneto camoniano sete anos de pastor Jacob servia à luz do cânone editorial de Leodegário A. de Azevedo Filho
Xosé Manuel Dasilva Fernández - Fotos de Leodegário A. de Azevedo Filho
Homenagem
Depoimentos
Entrevista
Artigos
Iconografia
sábado, 5 de agosto de 2017
A LOULÉ, COM AMOR
A LOULÉ, COM AMOR
Em Loulé, bela terra do meu País
Desfruto de
descanso merecido.
O meu ser
lhe está agradecido
Em seu seio
me sinto mais feliz.
Nela eu sinto
prazer sem igual,
Aqui, tão
bons tempos já passei!
Bem-estar que
jamais olvidarei,
Burgo
querido do meu Portugal.
No Algarve,
meu concelho eleito,
O lugar
amado onde me deleito,
Aqui queria
viver por teu favor.
Loulé da “Ti”
Anica e do Aleixo,
Em teu
burgo um pouco de mim deixo!
Guardo-te no
coração, meu Amor.
Julho de
2017
JGRBranquinho - “Little
White”
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