Considerado um dos poetas populares algarvios de maior relevo, famoso pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo também é recordado por ter sido simples, humilde e semi-analfabeto, e ainda assim ter deixado como legado uma obra poética singular no panorama literário português da primeira metade do século XX.
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Ser artista é ser alguém !
Que bonito é ser artista,
ver as coisas mais além
do que alcança a nossa vista !
De vender a sorte grande,
confesso, não tenho pena;
que a roda ande ou desande
eu tenho sempre a pequena.
Forçam-me, mesmo velhote,
de vez em quando, a beijar
a mão que brande o chicote
que tanto me faz penar.
Porque o mundo me empurrou,
caí na lama, e então
tomei-lhe a cor, mas não sou
a lama que muitos são.
Eu não tenho vistas largas,
nem grande sabedoria,
mas dão-me as horas amargas
lições de filosofia.
À guerra não ligues meia,
porque alguns grandes da terra,
vendo a guerra em terra alheia,
não querem que acabe a guerra.
Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão mesmo vencida,
não deixa de ser Razão?
Sei que pareço um ladrão...
mas há muitos que eu conheço
que, sem parecer que são,
são aquilo que eu pareço.
Enquanto o homem pensar
que vale mais que outro homem,
são como os cães a ladrar,
não deixam comer, nem comem.
Eu já não sei o que faça
p'ra juntar algum dinheiro;
se se vendesse a desgraça
já hoje eu era banqueiro.
A vida na grande terra
corrompe a humanidade.
Entre a cidade e a serra
prefiro a serra à cidade.
O mundo só pode ser
melhor do que até aqui,
- quando consigas fazer
mais p'los outros que por ti!
E