terça-feira, 9 de julho de 2013

ASSENTA- TE , MEU DINHEIRO

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   ASSENTA-TE, MEU DINHEIRO


 Estávamos nos primórdios do Séc. XX.
Um certo lavrador alentejano, um tanto cansado, já com dificuldade em continuar a assumir a direção dos trabalhos no seu Monte, por razões da avançada idade (e também porque os descendentes não manifestavam interesse nessa atividade) resolveu vender a sua rica propriedade.
Fez saber que a mesma estava à venda e logo apareceram outros lavradores interessados, muitos deles conhecidos e que, sabendo da sua decisão, o visitaram fazendo-se deslocar em luxuosos trens e charretes, ricamente ajaezados, ostentação própria dos endinheirados na época, naquela província, na altura denominada celeiro de Portugal.
Conhecedores da sua vontade de vender (sabe-se como isso funciona a favor de quem compra) ofereciam importâncias muito abaixo do verdadeiro valor do Monte, o que o levava a rejeitá-las.
Durante meses- bastantes meses- não aceitou nenhuma das propostas e continuava à espera que alguém avaliasse mais justamente a sua bela propriedade.
Falou com os filhos e com alguns amigos da sua confiança.
Já se dividiam as opiniões, como é natural, dizendo alguns que a última palavra seria sempre a dele, mas que, uma vez que ninguém apresentava melhores ofertas- próximas do valor que ele pretendia- talvez fosse melhor chamar o que apresentou a melhor e tentar negociar com ele.
Estava verdadeiramente indeciso.
Num certo dia, um dos criados veio avisá-lo que estava ali um homenzinho de aspeto pobre e mal cuidado, montado num humilde burro carregado com dois alforges e que dizia que queria falar com o patrão.
- Mas o que é que ele quer? Se pretende ficar cá, diz-lhe que pode ficar no palheiro.
O criado veio com a ordem e o homenzinho respondeu que podia até aceitar ficar lá aquela noite, que agradecia a atenção, mas que queria falar com o senhor da herdade, já.
Lá voltou o criado à dependência onde se encontrava o patrão e este, perante a insistência, decidiu mandá-lo subir..
Chegado à sua presença, o lavrador teve vontade de rir e atirou:- Então, o que é que vocemecê me quer?
-Eu quero comprar-lhe o Monte!
-Comprar-me o Monte?! Está a brincar comigo?
-Não, Senhor, estou aqui para lho comprar.
Esta conversa prolongou-se e o lavrador sem se dignar mandar sentar o homenzinho que se fazia acompanhar de dois alforges.
Volvidos mais alguns instantes, perguntou o patrão:- Então- vamos lá a ver- quanto oferece?

- Diga-me! E como é que me vai pagar?
Já cansado, pois carregava os alforges, sem que lhe fosse oferecida, sequer, uma cadeira, volveu:
- O senhor dirá quanto quer, pois o dinheiro está aqui, apontando para os alforges.
 Admirado e encavacado, o lavrador resolveu, então, mandá-lo sentar, acreditando estar ali o dinheiro.
Reação do humilde comprador:- " Assenta-te, meu dinheiro!"- ficando de pé e colocando os alforges na cadeira, deixando o lavrador ainda mais encavacado e a apresentar-lhe desculpas.
Negociaram por alguns instantes e acertaram o valor a pagar, com a entrega imediata do dinheiro.
Surpreso- o lavrador, meio comprometido- lá se ia desculpando e, tendo-se feito tarde, fez-lhe o convite para pernoitar e acertarem os pormenores da escritura a ser feita na cidade mais próxima,dentro de breves dias.
Diga-se que o dinheiro chegou e...sobrou!
À noite, já à mesa, o lavrador quis saber porque se apresentava naquele estado- com aspeto humilde e aparentemente pouco cuidado- ao que ele respondeu que assim ninguém o assaltava!
Era uma atitude inteligente, na verdade, pois assim ninguém suporia que ele traria tanto dinheiro.
Velha sabedoria!  Velha sabedoria!
Aliás, conheço um outro caso em que um amigo do meu pai, viajava sempre em terceira classe nas viagens de comboio, pois dizia que à chegada ao local do destino- especialmente a Lisboa- nunca seria abordado pelos " amáveis" vigaristas na estação do Rossio ou de S.ta Apolónia.
Velha sabedoria! Velha sabedoria!

Quinta da Piedade, 9 de julho de 2013
JGRBranquinho

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