sábado, 5 de abril de 2014

NUNCA VIRAM UMA MULHER BONITA ?



NUNCA VIRAM UMA MULHER BONITA?!

NUNCA VIRAM UMA MULHER BONITA?
Era uma linda mulher- mulher já feita- dos seus vinte e tais, que eu, naturalmente, apesar dos meus verdes anos- à volta dos doze, treze- muito admirava; e não era só eu, pois ela dava nas vistas pelo seu porte escultural, por onde quer que passava.
Fazia-se acompanhar, sempre, por uma rapariguita- sua serviçal- tanto nas idas ao mercado como nas compras às lojas e era muito comum escutarem-se comentários elogiosos tanto de homens (de olhos gulosos e arregalados) como de mulheres, que viam nela um verdadeiro modelo.
Vestia-se à moda daquele tempo, que bem bonita era para o meu gosto.
Calçava sapatos de salto alto, usava blusa e saia a condizer ou um esmerado vestido bem adaptado ao corpo, penteando os seus belos, sedosos cabelos pretos, que apanhava atrás num redondo e volumoso troço bem cuidado.
Pintava-se muito ao de leve, pois era dotada de uma pele muito fresca e rosada- uma verdadeira obra de arte saída das mãos de excelso escultor- obra divina, por certo. Como alguns diziam:- Um verdadeiro monumento! Nos dias de hoje, o que na gíria chamaríamos um avião.
Comportava-se impecavelmente, ninguém tendo nada que apontar a esta flor humana, como outros a designavam.
Dizia-se que era uma lavradora rica, mas não se lhe conhecia família, nem de onde era, e eu nunca lhe soube o nome!
Um dia, numa loja, umas mulheres do campo- extasiadas- fitaram-na de tal modo, que ela perguntou:- “Nunca viram uma mulher bonita?!”
Ao tempo, a situação era de muito respeito pelos ricos e nunca ouvi alguém que tivesse o desplante de a provocar ou interrogar. Aliás, nem ela dava azo a conversas, parecendo que não conhecia ninguém, vivendo isolada do resto da população da cidade.
Veio a saber-se (tudo se vem a saber mais cedo ou mais tarde) que vivia ali sustentada por um abastado lavrador, de quem tinha sido criada de servir, num Monte dali distante, daí a razão de ninguém a conhecer. Aliás, seria mesmo por isso que viera para uma cidade distante.
Teria recebido educação adequada às circunstâncias- não se sabia onde- mas isso notava-se no seu comportamento exemplar.
Nunca foi vista com o homem, esse tal lavrador! Lá teriam os seus encontros, mas com tanta discrição que ninguém tinha conhecimento na cidade, ou então, os que sabiam, estavam bem recomendados para não darem com a língua nos dentes, como soe dizer-se.
Mas, porquê?!  Admitia-se como quase certo que o lavrador teria família constituída e não queria que fosse conhecida a situação.
Vem agora ao caso contar-vos um episódio:- Um certo dia, vinha ela do mercado numa daquelas ruas estreitas da cidade, acompanhada da criadita, que com dificuldade carregava dois enormes sacos de compras.
Duas pessoas minhas conhecidas, cruzaram-se com elas e, às tantas, ouvem-na dizer, dirigindo-se à rapariga:-" Ó Maria, vais à rasca?!"
Claro que o conceito que dela tinham, ficou um pouco abalado…  Já se comentava que, afinal, a senhora não teria tido, assim, tão bons princípios. À época dava-se muita importância aos modos de dizer e falar- anos quarenta, notem- e o caso atingiu laivos de escândalo; gente que por inveja, também, logo começou a desancar  na mulher bonita, algumas vezes exageradamente, querendo colocá-la em xeque e, tanto mais, quanto era bem elevado o conceito em que a senhora era tida- até ali- no meio, pois nunca se lhe escutara palavra, a não ser quando as tais mulheres do campo se pararam a olhá-la.
Eu saí da região nos anos cinquenta e, por estranho que pareça, esqueci o caso, pois só ali voltava por altura de férias ou em algum breve fim-de-semana.
Na altura dizia-se que um dia ela teria a companhia efetiva do seu amado protetor, isto é, ele daria a cara e viveriam juntos para sempre.
Cada um de vós dará, por palpite ou sentimento romântico/poético, o desfecho que entender.
Sem romancear, contei-vos com verdade um caso real que conheci na sagrada terra alentejana, sem prejuízo de ainda vir a procurar saber como findou. Espero que bem, sinceramente.

Quinta da Piedade, 1 de abril de 2014
JGRBranquinho
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